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Presidente Jair Bolsonaro e seu ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. UESLEI MARCELINO / REUTERS |
El País
O Governo brasileiro estima vacinar toda a população contra a covid-19 em um prazo de 16 meses, a partir do registro da Anvisa e da disponibilidade dos imunizantes nos estoques da pasta. Segundo o cronograma apresentado pelo ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, ao Supremo Tribunal Federal (STF), são necessários cinco dias para que a vacina chegue aos Estados a partir do aval da agência reguladora. A partir daí, serão quatro meses para imunizar os grupos prioritários já definidos na estratégia nacional ―o primeiro dos quatro perfis inclui profissionais da saúde, idosos e indígenas. Só depois será iniciada a imunização da população em geral, que deve durar mais 12 meses.
“O que dependerá,
concomitantemente, do quantitativo de imunobiológico disponibilizado para uso”,
explica o documento. Ainda não há uma data definida para iniciar a vacinação,
já que nenhuma vacina tem a autorização da Anvisa. Segundo o Ministério da
Saúde, após o envio das doses, cabe aos Estados distribuir as vacinas aos
municípios, com apoio logístico da pasta, como já acontece em outras campanhas
de vacinação. Ao todo, o plano nacional de imunização contra a covid-19 contém
cinco fases e deve demorar 16 meses para ser completamente executado.
Sob pressão, Pazuello tem
sinalizado que deverá começar a campanha de vacinação no Brasil com a primeira
vacina a receber o aval da Anvisa. Mesmo assim, gestores estaduais têm mantido
suas agendas em busca de um plano B para garantir o início da vacinação nas
populações que governam o mais rápido possível. Como mostra reportagem do EL
PAÍS, o esboço da estratégia nacional apresentado no fim de semana era vago,
previa poucas vacinas e não continha sequer um cronograma. Nesta terça-feira,
gestores começaram a se reunir com o governador paulista João Doria para
formalizar acordos para a aquisição da Coronavac ―entre eles o prefeito de Belo
Horizonte, Alexandre Kalil, e o governador do Ceará, Camilo Santana. Segundo o
Governo de São Paulo, 4 milhões de doses do imunizante estão sendo
disponibilizadas para os profissionais da linha de frente no combate à pandemia
em todo o Brasil.
“Estamos aqui para um plano
B. Todo o Brasil tem o direito de imunizar seus profissionais de saúde”,
afirmou o prefeito Kalil. Camilo Santana usou um tom mais ameno e voltou a
pregar a necessidade de união para uma campanha simultânea em todo o país, mas
seguiu as tratativas para conseguir o medicamento para o seu Estado.
“Conversamos sobre a
produção da vacina da covid-19 pelo Butantan e sobre o Plano Nacional de
Imunização, que discuti ontem com o ministro Pazuello”, afirmou Santana em um
vídeo. Ao lado dele, o governador de São Paulo fez questão de dizer que a
visita foi para a “definição da quantidade de vacinas necessárias para a
primeira etapa de vacinação dos profissionais de saúde do Ceará”. Doria tem
elevado a pressão sobre a Anvisa e o Governo brasileiro em favor da Coronavac.
Por enquanto, nenhuma vacina solicitou registro emergencial ou definitivo no
país.
Nesta semana, o presidente
Jair Bolsonaro anunciou que assinará uma medida provisória para destinar 20
bilhões de reais à aquisição de vacinas, mas afirmou que pode incluir no texto
a exigência de que o usuário assine um termo de consentimento para receber o
medicamento. O gestor, que chegou a rejeitar publicamente a Coronavac, empurrou
ao centro de uma intensa batalha ideológica a Anvisa ―agência reguladora
brasileira responsável por aprovar a aplicação dos imunizantes no território
nacional. E vê seu Governo enfrentar uma nuvem de desconfiança depois de
apresentar à Justiça uma “prévia” de plano de vacinação com mais de 90 páginas,
repleto de lacunas e criticado pelos próprios especialistas da câmara técnica
que cooperava na estratégia brasileira.
Medidas “parciais” e
“equivocadas”
A Associação Brasileira de
Saúde Coletiva (Abrasco) chegou a enviar nesta terça uma carta ao Supremo
Tribunal Federal na qual afirma que Pazuello apresentou medidas “parciais” e
“equivocadas” sobre a vacinação contra a covid-19 no documento que enviou à
Corte no último sábado. A entidade indicou especialistas para a câmara técnica
responsável por discutir a estratégia nacional; especialistas que negam ter
participado efetivamente de plano do Governo. Por isso, destaca que o texto é
de “exclusiva responsabilidade do Governo federal”.
A primeira reunião conjunta
dos 10 eixos que compõem a câmara técnica para elaborar o plano nacional de
vacinação contra a covid-19 aconteceu apenas no dia primeiro de dezembro, com
microfones fechados aos pesquisadores que atuam no grupo. Considerações ou
perguntas sobre a apresentação dos funcionários do Ministério da Saúde deveriam
ser enviadas por um chat, e o prazo para a resposta seria de 7 dias.
Questionamentos feitos ―um deles sobre a aquisição da Coronavac― não chegaram a
ser respondidos. Nem mesmo o acesso aos slides de apresentação foi concedido.
Até a referida reunião, o
clima entre o corpo técnico e o Ministério da Saúde era de cooperação, conforme
apurou o EL PAÍS com integrantes do grupo. Mas o envio de um documento sem
revisão dos especialistas gerou uma série de críticas públicas. Uma nova
reunião com a câmara técnica estava marcada para esta terça-feira, às 14h,
segundo pesquisadores que integram o grupo. O encontro foi então adiado para as
17h, e depois para esta quarta-feira.
Pesquisadores de renome no país têm sido categóricos ao apontar o atraso do país com seu plano de vacinação contra a covid-19, apesar de o Brasil ser referência mundial em campanhas de imunização. O país patinou não apenas nos acordos para adquirir diferentes tipos de vacinas promissoras num cenário pandêmico de aquecimento do mercado global, mas também deixou de tomar providências logísticas, como a aquisição de seringas, agulhas e refrigeradores. “O Brasil está seis meses atrasado em plano para vacina”, afirmou a pesquisadora e pneumologista da Fiocruz Margareth Dalcolmo em uma entrevista nesta segunda ao programa Roda Viva. O Ministério da Saúde agora precisa correr atrás do prejuízo, enquanto enfrenta pressões que vão da Justiça a governadores e prefeitos, passando pelo próprio corpo de especialistas que participam da discussão da estratégia nacional.
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